?? ???? ??, ??? ?? ?? ? ???????? / Vida digital para pessoas Mon, 21 Oct 2024 18:55:26 +0000 pt-BR hourly 1 //wordpress.org/?v=6.6 //emiaow553.com/wp-content/blogs.dir/8/files/2020/12/cropped-gizmodo-logo-256-32x32.png ???? / 32 32 ??? ?? ????? ?????? //emiaow553.com/milho-chegou-ao-brasil-pela-amazonia-ocidental-e-foi-domesticado-ao-longo-de-ondas-migratorias/ Mon, 21 Oct 2024 20:30:20 +0000 //emiaow553.com/?p=604394 Estudo revela que características primitivas da espécie ainda existem, apesar de longa intervenção humana e cultivo em ambientes diversos

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Texto: Enrico Di Gregorio/Revista Pesquisa Fapesp

Há milhares de anos, o milho é parte fundamental da alimentação de muitas culturas indígenas das Américas. No Brasil, receitas e bebidas feitas com o cereal, como o preparado levemente alcoólico chamado de cauim pelos povos Tupi, fazem parte da dieta amazônica e são usadas em rituais. Algumas etnias indígenas brasileiras, como os Guarani Mbya, o consideram sagrado. É o grão mais produzido em escala mundial, em grande parte como alimento na pecuária e com presença notável na alimentação humana. Essa relevância faz com que arqueólogos e geneticistas hoje investiguem a origem, a dispersão e os processos de domesticação por quais o milho passou desde a origem da agricultura nas Américas.

Novas interpretações publicadas na quarta-feira (4/9) na revista Science Advances mostraram as similaridades entre amostras arqueológicas do milho e raças cultivadas atualmente por indígenas e agricultores tradicionais brasileiros. Os autores defendem que o milho chegou há 6 mil anos no sudoeste da Amazônia, a partir de sua origem no México, 9 mil anos atrás, de forma apenas parcialmente domesticada e, depois, passou por diferentes etapas de seleção e diversificação em regiões como o Centro-Oeste, Sul e Sudeste do país.

Isso não significa que a domesticação inicial se tenha completado na Amazônia. Amostras de milho encontradas em Minas Gerais com datas entre 570 e 1010 anos antes do presente têm características compatíveis com o primeiro milho plantado nas Américas. Atualmente, existem cerca de 300 raças de milho no continente americano. Delas, 15 são brasileiras, divididas em 19 sub-raças, das quais quatro são nativas, associadas aos indígenas, e são chamadas de Entrelaçado, Caingang, Avati Moroti e Lenha.

Os pesquisadores analisaram a morfologia e o DNA de 282 espigas fragmentadas, duas inteiras e 12 grãos de milho antigos encontrados nos anos 1990 por uma equipe do Museu de História Natural da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) coordenada pelo arqueólogo francês André Prous no vale do Peruaçu, no norte do estado. A curadoria do material hoje está a cargo do engenheiro-agrônomo e geneticista Fábio de Oliveira Freitas, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Recursos Genéticos e Biotecnologia, em Brasília, um dos autores do artigo. “?uma quantidade grande de material encontrado naqueles sítios arqueológicos, ainda mais considerando o alto potencial de degradação devido às condições tropicais do país. A preservação ocorreu porque os milhos estavam em cavernas e foram enterrados dentro de cestos? diz a geneticista Flaviane Costa, pesquisadora em estágio de pós-doutorado na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP) e primeira autora do artigo. Ela fez as análises no âmbito de projetos coordenados pelas geneticistas Elizabeth Ann Veasey, sua orientadora no doutorado, e Maria Imaculada Zucchi, supervisora atual.

O teosinto, como essas amostras da Universidade Harvard, corresponde à forma ancestral do milho. Imagem: Flaviane Costa / USP

Todos os exemplares tinham o que os biólogos chamam de endosperma farináceo: uma grande parte do corpo do grão, onde os nutrientes ficam armazenados, era opaca. Outras versões, mais transparentes, são classificadas como vítreas. As amostras arqueológicas foram comparadas às variantes de milho com endosperma farináceo, cultivadas atualmente por povos indígenas e agricultores tradicionais brasileiros, e com o teosinto, uma planta silvestre aparentada ao milho e considerada semelhante à sua forma ancestral. Os exemplares de teosinto estão armazenados no Museu de Arqueologia e Etnologia de Peabody, da Universidade Harvard, nos Estados Unidos. As informações de milho moderno foram obtidas em coleções da USP e da Universidade da República, no Uruguai.

As amostras arqueológicas são espigas cônicas com quatro a 40 grãos em cada uma de quatro a 18 fileiras. Essa configuração tem semelhanças com o teosinto moderno, cujas espigas cilíndricas têm entre duas e oito fileiras, com número de grãos que varia entre seis e 27 em cada uma. Eles definiram, com base nesses números, que um bom parâmetro para classificar as variantes primitivas de milho, ou seja, as anteriores ou mais basais do processo de domesticação, seria um número de fileiras inferior a oito, porque nenhuma raça moderna do cereal nas chamadas terras baixas da América do Sul se enquadra nesse critério ?normalmente, essas raças sul-americanas exibem cerca de 12 fileiras, mas podem chegar a até 26. Entre as amostras de teosinto, 95% tinham menos de oito fileiras.

Milho arqueológico encontrado em Minas Gerais preserva características antigas

Milho arqueológico encontrado em Minas Gerais preserva características antigas. Imagem: Fábio de Oliveira Freitas / Embrapa

Os geneticistas encontraram, em meio às 282 amostras do vale do Peruaçu, 14 exemplares arqueológicos com quatro ou seis fileiras, apesar de a domesticação do cereal ter se iniciado há 9 mil anos no México e há 5 mil anos na Amazônia ocidental. “Isso é algo completamente novo? diz o arqueólogo Tiago Hermenegildo, pesquisador em estágio de pós-doutorado no Instituto Max Planck de Geoantropologia, na Alemanha, também vinculado ao Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE) da USP. Ele faz pesquisa arqueológica com milho na Amazônia, mas não participou do estudo. O traço é peculiar porque, em tese, o longo processo de domesticação, marcado pelo aumento das fileiras de grãos, deveria ter eliminado essas características.

A novidade, ao lado de dados comparativos levantados pelos autores, indica que o milho ainda não estava completamente domesticado quando chegou ao Brasil. “O artigo é disruptivo porque, até 2018, se pensava que toda a domesticação do milho havia ocorrido no México? afirma Costa. “Havia um imenso vazio de dados para as terras baixas da América do Sul, que são as regiões do continente abaixo de 1.500 metros de altitude.?/p>

Imagem: Alexandre Affonso / Revista Pesquisa FAPESP

Um estudo de 2018 tinha mapeado o genoma completo de diversas variedades de milho na América do Sul e verificado uma variação nos genes associados à domesticação do milho. Quando o processo está completo, espera-se que formas genéticas (alelos) que aumentam o número de grãos, por exemplo, se tornem as únicas existentes ?ou fixadas, no jargão geneticista. “Agora mostramos exemplares arqueológicos de milho encontrados no Brasil com características primitivas, o que corrobora esses trabalhos anteriores? afirma a pesquisadora da Esalq.

Ainda não há consenso. “O que os estudos genéticos afirmam é que no início da domesticação, no México, o milho tinha uma troca de genes muito mais intensa com as variantes silvestres? diz Hermenegildo. “Quando chega ao Brasil, essa troca já não ocorre, apesar de ainda haver fluxo gênico com outras variedades, em um processo de domesticação secundária, e isso é reforçado pelo novo trabalho.?/p>

Migração no continente

O grupo de Costa também buscou traçar a rota de migração do milho no continente. Para isso, identificou similaridades entre os grupos existentes e os exemplares comparados às amostras arqueológicas de milho das raças Entrelaçado, Caingang, Avati Moroti e Lenha, além de resultados sobre as mesmas raças publicados em outros artigos. Foi assim que descobriram que exemplares locais de Entrelaçado da Amazônia ocidental se aproximavam das amostras arqueológicas encontradas no Cerrado e na Caatinga.

Pinturas rupestres em cavernas do Peruaçu indicam que milho e buriti faziam parte da vida dos povos que habitavam a região

Pinturas rupestres em cavernas do Peruaçu indicam que milho e buriti faziam parte da vida dos povos que habitavam a região. Imagem: Fábio de Oliveira Freitas / Embrapa

O milho Avati Moroti está presente em várias partes do Brasil. Exemplares dessa raça encontrados no Cerrado mostraram proximidade com uma amostra da Mata Atlântica e outras descritas na literatura científica. Enquanto isso, outro subgrupo da mesma raça foi identificado mais ao Sul, na região do Pampa. Variedades locais dos milhos Caingang e Lenha também existem no Pampa e na Mata Atlântica.

Isso tudo ajudou os pesquisadores a propor um caminho de migração do cereal. Para eles, o milho foi trazido ao Brasil por migrações à Amazônia ocidental, de onde foi levado para as regiões de Caatinga e Cerrado, no Centro-Oeste e Nordeste. Ao mesmo tempo, outras ondas de migração também transportaram o grão para as regiões de Mata Atlântica, sobretudo no Sudeste, e ao Pampa, no Sul do Brasil.

“A comunidade científica conhece esses milhos nativos desde 1958, mas ninguém na arqueologia deu atenção até os anos recentes? destaca Hermenegildo. “Essas evidências atuais sobre o vegetal chegaram a ser completamente ignoradas por décadas de pesquisas arqueológicas na Amazônia; o trabalho é fundamental nesse sentido.?/p>

Ao pôr em evidência a resiliência das características primitivas do milho, o trabalho também tem impacto para as políticas de preservação e manejo atuais. Para Costa, a presença ao longo de milênios de variedades exclusivamente sul-americanas reforça a necessidade de políticas públicas e acordos internacionais para a conservação dessas raças nativas. A falta dessas políticas pode levar ao risco de extinção das variedades locais e raças nativas que ainda existem. “O trabalho valoriza o plantio realizado por populações tradicionais e indígenas?

Para Hermenegildo, isso é importante porque muitos tipos de milho plantados pelos povos indígenas foram extintos junto com seus agricultores. “Foi uma verdadeira erosão cultural e genética, desde os tempos da colonização.?/p>

Uma versão deste texto foi publicada na edição impressa representada no pdf.

Projeto
Genômica populacional e caracterização fenotípica para elucidar aspectos da origem, domesticação e dispersão do urucum (Bixa orellana) e milho (Zea mays) nas terras baixas da América do Sul (nº 15/26837-0); Modalidade Auxílio à Pesquisa ?Regular; Pesquisadora responsável Elizabeth Ann Veasey (USP); Investimento R$ 192.720,56.

Artigo científico
COSTA, M. F. et al. Archaeological findings show the extent of primitive characteristics of maize in South America. Science Advances. v. 10. 4 set. 2024.

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??? 1-3-2-6 ?????????, ?????????? //emiaow553.com/ambiente-boas-praticas-produtivas-podem-reduzir-emissoes-de-carbono-no-campo/ Tue, 08 Oct 2024 12:13:48 +0000 //emiaow553.com/?p=600882 Manter a palha sobre o campo e aprimorar os cuidados como o solo contribui para a redução de gases de efeito estufa na agricultura

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Texto: Domingos Zaparolli e Yuri Vasconcelos / Revista Pesquisa Fapesp

Remover de forma indiscriminada a palha da cana-de-açúcar do campo após a colheita pode reduzir os estoques de carbono no solo e elevar as emissões de gases de efeito estufa (GEE). Já se sabia que a palha usada nas usinas para a produção de etanol celulósico (2G) e de eletricidade fornece vários serviços ecossistêmicos, como retenção de água no solo e controle de erosão. Agora, um estudo do Laboratório Nacional de Biorrenováveis do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (LNBR-CNPEM), em Campinas, mostrou que também é importante para a garantia de estoque de carbono no solo.

Enquanto cresce, a cana captura dióxido de carbono (CO2) da atmosfera e o acumula na palha, no colmo e nas raízes. Quando a cana é colhida, a palha é deixada no campo e, com o tempo, o CO2 nela contido se transforma em carbono estabilizado no solo. A transferência de carbono da atmosfera para o solo favorece o balanço de emissões do setor.

“Foi a primeira vez que uma pesquisa incluiu os estoques de carbono do solo na contabilização das emissões de GEE do ciclo de vida da bioenergia derivada da palha? conta o engenheiro-agrônomo Ricardo Bordonal, primeiro autor de um artigo com esses resultados publicado em julho na revista Science of the Total Environment. “Utilizando modelos de simulação e avaliação do ciclo de vida, concluímos que, dependendo da quantidade de palha removida, os benefícios ambientais quanto ao balanço de GEE variam.?/p>

Os pesquisadores avaliaram o impacto no balanço de carbono por meio de três cenários: remoção de 100% da palha, de 50% e de 0%. “Para a produção de bioeletricidade nas usinas, não vale a pena retirar a palha? diz Bordonal. “Como o Brasil já tem uma matriz elétrica limpa, que emite pouco carbono, é mais vantajoso deixar a palha no campo para que o carbono contido nela seja fixado no solo.?/p>

De acordo com esse estudo, apoiado pela FAPESP e pelo projeto Sugarcane Renewable Electricity (SUCRE) do Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas, a remoção para a produção de etanol 2G, contudo, pode ser vantajosa. “A retirada orientada de 50% da palha do campo para a produção de etanol celulósico é eficaz na mitigação das emissões de GEE, já que a substituição de gasolina por etanol no carro leva a uma redução da emissão de CO2 que compensa o carbono que seria acumulado no solo? comenta Bordonal. Segundo ele, quando se remove toda a palha, a perda, em termos de fixação de carbono, porém, é maior e não compensa.

“A pesquisa traz uma mensagem forte para o setor. Não há custo zero em tirar a palha para produzir etanol 2G ou bioeletricidade? diz o engenheiro-agrônomo Maurício Cherubin, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP) e vice-coordenador do Centro de Estudos de Carbono em Agricultura Tropical (CCarbon-USP), um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid) apoiados pela FAPESP. “Sempre que se deixa a palha no campo, é possível acumular entre 400 quilos [kg] e 500 kg de carbono por hectare por ano.?/p>

Sistema de integração lavoura-pecuária-floresta é outra estratégia para reduzir a emissão de gases de efeito estufa

Sistema de integração lavoura-pecuária-floresta é outra estratégia para reduzir a emissão de gases de efeito estufa. Imagem: Gisele Rosso? Embrapa

Para reduzir as emissões

Esse estudo reflete o esforço para aprimorar os cuidados com o solo e reduzir as emissões de GEE da agropecuária brasileira, responsável por 27% dos 2,3 bilhões de toneladas de gás carbônico equivalente (CO₂e) emitidos no país em 2022, correspondentes a 9,6 toneladas por hectare; gás carbônico equivalente é uma medida internacional que estabelece a equivalência entre todos os GEE (metano, óxido nitroso e outros) e o CO2.

“Técnicas produtivas mais sustentáveis poderiam auxiliar a agropecuária brasileira a superar a condição de emissora líquida de GEE e se tornar protagonista no esforço do país para conter as mudanças climáticas? ressalta o engenheiro-agrônomo da Esalq Carlos Eduardo Cerri, coordenador do CCarbon-USP. “São técnicas que substituem os sistemas baseados em monoculturas por modelos que promovem a biodiversidade. Melhoram a saúde do solo, reduzem as emissões de GEE e promovem o sequestro de carbono no solo.?Instituído oficialmente em setembro de 2023, o centro, sediado na Esalq, em Piracicaba, reúne cerca de 40 pesquisadores e 90 bolsistas.

Para o engenheiro-agrônomo Guilhermo Congio, a criação de um centro de pesquisa em carbono voltado à agricultura tropical pode trazer benefícios ao país: “Além da redução das emissões de GEE, o CCarbon-USP poderá elucidar questões relativas à segurança alimentar, à economia de baixo carbono, ao desenvolvimento social, entre outras? Congio trabalha no Instituto de Pesquisa Nobel, nos Estados Unidos, que desenvolve técnicas para reduzir os impactos ambientais da produção de bovinos de corte. “Em um de nossos projetos, buscamos quantificar métricas de saúde do solo para ambientes de pastagens e vinculá-las a ferramentas de sensoriamento remoto, bem como determinar como as práticas dos pecuaristas impactam a saúde do solo e o sequestro de carbono em pastagens nativas e cultivadas? relata.

Sistemas produtivos inspirados em processos naturais conhecidos como soluções baseadas na natureza (SbN) geram sustentabilidade, produtividade e serviços ambientais, como o sequestro de carbono, argumentam pesquisadores agora associados ao CCarbon-USP em um estudo de março de 2023 na Green and Low-Carbon Economy. São exemplos de SbN a ocupação de uma mesma área para produção agrícola, criação de animais e plantio de árvores (ver Pesquisa FAPESP nº 314), uso de biofertilizantes e controle biológico de pragas.

“Temos a possibilidade de substituir um ciclo produtivo de pouca atenção ao ambiente por outro, que aproveita a capacidade natural das plantas de capturar carbono da atmosfera e a do solo de armazenar esse carbono? diz Cherubin. Segundo ele, uma área agrícola com solo saudável é capaz de reter o carbono por longo tempo: “O carbono enriquece o solo com nutrientes e gera ganhos de produtividade? Por sua vez, o aumento na produção vegetal proporciona mais sequestro de CO2, o que resulta em áreas ainda mais ricas e produtivas.

Inversamente, o solo degradado leva à baixa produtividade e capacidade de reter carbono, que em grande parte retorna à atmosfera como CO2. Quanto mais degradado o solo, maior a dependência de fertilizantes nitrogenados para estimular o crescimento das plantas. Esses fertilizantes são compostos petroquímicos, cujo processo produtivo é realizado mediante emissões de gases poluentes. Além disso, o uso de fertilizante nitrogenado para adubar as plantas resulta na emissão de óxido nitroso (N₂O), um GEE 300 vezes mais potente do que o CO?

A biodiversidade microbiana

A saúde do solo depende de sua composição mineral e da biodiversidade vegetal e microbiana. Sistemas produtivos intensivos baseados em monoculturas ?por exemplo, de grãos, cana-de-açúcar ou pasto para o gado ?empobrecem o solo. Uma linha de pesquisa do CCarbon-USP examina como as mudanças na composição e na atividade do microbioma do solo poderiam interferir no sequestro de carbono nos sistemas agrícolas.

“Vamos utilizar as abordagens microbiológicas mais consolidadas, como sequenciamento e quantificação massiva de genes, metagenômica [estudo da comunidade de microrganismos de determinado ecossistema] e bioinformática? diz o engenheiro-agrônomo da Esalq e do CCarbon-USP Fernando Dini Andreote. Um dos objetivos é propor formas para reduzir o uso de fertilizantes nitrogenados e defensivos agrícolas, gerando menor emissão de GEE.

A agricultura brasileira já adota técnicas para preservar a biodiversidade e promover a saúde do solo, como a rotação de culturas, que alterna as espécies vegetais em uma mesma área, e o plantio direto, no qual os resíduos da colheita permanecem sobre o terreno e a semeadura é feita sobre o solo não revolvido mecanicamente. Segundo Cerri, o plantio direto absorve até meia tonelada de CO?por hectare por ano.

Área com crotalária, leguminosa de rápido crescimento, usada para fixar nitrogênio no solo, em rotação com o algodão.

Área com crotalária, leguminosa de rápido crescimento, usada para fixar nitrogênio no solo, em rotação com o algodão. Imagem: Valdinei Soffiati? Embrapa

Converter áreas de pastagens degradadas e agricultura convencional em sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) ou sua versão sem o plantio de árvores (ILP) também poderia reduzir a emissão de GEE. “O solo de sistemas integrados é um potencial dreno para metano [CH4], consumindo entre 0,8 e 1 kg do gás por hectare por ano. Já a transição de monocultura de pastagens para sistemas integrados reduziu a emissão de óxido nitroso em até 1,63 kg por hectare por ano? informa o engenheiro-agrônomo Wanderlei Bieluczyk, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena) da USP e primeiro autor de um estudo da edição de junho na Journal of Cleaner Production que detalha esses resultados. Gás 30 vezes mais danoso que o CO? o metano é produzido na digestão de bovinos e liberado principalmente por meio de arrotos.

Financiada pelo Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI), apoiado pela FAPESP, a pesquisa revelou que a conversão de pastagem degradada em sistemas integrados tem o potencial de reduzir a intensidade de metano entérico gerado pelo gado com eliminação de até 122 gramas do gás por quilo de ganho de peso diário médio. “Basicamente se produz a mesma quantidade de carne com uma queda de cerca de 25% da emissão de metano entérico? calcula Bieluczyk. O Brasil detém o maior rebanho bovino comercial do mundo, com aproximadamente 220 milhões de animais.

Para Congio, é importante que as estimativas do balanço de carbono da agropecuária no Brasil adotem uma padronização nas unidades de fluxos dos GEE ?recomendação feita no artigo científico de Bieluczyk. “Muitos estudos usam fatores de conversão dos GEE recomendados pelo IPCC [Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas], que são geralmente baseados em trabalhos desenvolvidos em condições de clima temperado e sistemas de produção distintos dos tropicais.?/p>

Um dos propósitos do CCarbon-USP é identificar combinações de plantas e formas de ocupação do solo mais adequadas para compor um sistema de produção que proporcione maior retenção de carbono, torne o solo mais saudável e aumente a produtividade agrícola. Os pesquisadores miram as plantas de cobertura, como braquiárias, crotalárias, milheto e sorgo, usadas entre o plantio das culturas principais.

“Depois da colheita da soja, por exemplo, o agricultor deve utilizar uma dessas plantas para, literalmente, cobrir o solo? explica Cherubin. “Elas têm um papel crucial, pois ajudam a ciclar nutrientes, fixar nitrogênio atmosférico, sequestrar carbono, controlar nematoides e proteger o solo contra o impacto das gotas da chuva e da erosão.?Segundo ele, na última safra, por causa das altas temperaturas, algumas lavouras de Mato Grosso precisaram fazer três replantios por não ter o solo coberto com a palhada.

Em julho, o grupo de pesquisa em manejo e saúde do solo da Esalq, associado ao CCarbon-USP, publicou o e-book Guia prático de plantas de cobertura: espécies, manejo e impacto na saúde do solo, com o propósito de auxiliar os agricultores a planejar melhor a janela de cultivo. “Imprimimos 3 mil cópias e entregamos a produtores rurais em um evento na Bahia? relata Cherubin. Segundo ele, a agropecuária é bastante vulnerável às mudanças climáticas. “Hoje, é parte do problema, emitindo GEE. Pretendemos mostrar ao produtor que, adotando práticas de manejo sustentáveis, ele pode ser parte da solução, sequestrando carbono e revertendo esse carbono em ganho de produtividade. O maior beneficiário será o próprio produtor rural.?/p>

A reportagem acima foi publicada com o título ?strong>Carbono como aliado?na edição impressa nº 343, de setembro de 2024.

Projetos
1.
Centro de Pesquisa de Carbono em Agricultura Tropical (CCarbon) (no 21/10573-4); Modalidade Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid); Pesquisador responsável Carlos Eduardo Pellegrino Cerri (USP); Investimento R$ 26.319.364,85.
2. Efeito da mudança do uso da terra e das práticas de manejo de cana-de-açúcar no C do solo, na saúde do solo e nos serviços ecossistêmicos associados: Uma síntese de evidências (no 23/11337-8); Modalidade Bolsa de Pós-doutorado; Pesquisador responsável Maurício Roberto Cherubin (USP); Bolsista Carlos Roberto Pinheiro Junior; Investimento R$ 244.824,36.
3. Implicações da expansão e intensificação do cultivo da cana-de-açúcar nos serviços ecossistêmicos do solo (nº 18/09845-7); Modalidade Auxílio à Pesquisa ?Regular; Pesquisador responsável Maurício Cherubin (USP); Investimento R$ 158.472,12.
4. Dinâmica do carbono do solo e balanço de gases de efeito estufa: Implicações da remoção da palha de cana-de-açúcar para produção de bioenergia (nº 17/23978-7); Modalidade Auxílio à Pesquisa ?Regular; Pesquisador responsável Ricardo Bordonal (CNPEM); Investimento R$ 83.507,09.

Artigos científicos
BORDONAL, R. O. et al. Carbon savings from sugarcane straw-derived bioenergy: Insights from a life cycle perspective including soil carbon changes. Science of the Total Environment. 11 jul. 2024.
DENNY, D. M. T. et al. Carbon farming: Nature-based solutions in Brazil. Green and Low-Carbon Economy. v. 1, n. 3, p. 130-7. 4 mai. 2023.
BIELUCZYK, W. et al. Greenhouse gas fluxes in Brazilian climate-smart agricultural and livestock systems: A systematic and critical overview. Journal of Cleaner Production. v. 464, 142782. 20 jul. 2024.

Livro
CHERUBIN, M. Guia prático de plantas de cobertura: espécies, manejo e impacto na saúde do solo. USP. jun. 2024.

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????? ???? 2024-2025? ??? ??? ?? //emiaow553.com/inovacoes-enobrecem-o-cafe-brasileiro/ Sat, 08 Jun 2024 19:03:08 +0000 //emiaow553.com/?p=574447 Novas técnicas de cultivo e análises refinadas ressaltam o aroma e o sabor da bebida não alcoólica mais consumida no país

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Texto: Carlos Fioravanti/Revista Pesquisa Fapesp

Desenha-se uma nova etapa da história do café no país. Invertendo a tendência consolidada nos anos 1960 pelo extinto Instituto Brasileiro do Café (IBC), que enfatizava o aumento contínuo de produção para dar conta das vendas para outros países, agora a prioridade é a qualidade. Ditada pelas oportunidades de mercado e apoiada em trabalhos feitos em institutos de ensino e pesquisa, a reorientação vale principalmente para a espécie Coffea arabica (ou arábica), que ocupa 80% da área plantada no Brasil. De modo geral, ela tem menos cafeína, mais aroma, doçura e acidez que a outra espécie cultivada no país, C. canephora (ou canéfora), para a qual se busca ampliar tanto a qualidade quanto a produção.

Para os cafeicultores, a mudança de estratégia implica atenção incessante às técnicas de cultivo e ao beneficiamento e a adoção de equipamentos capazes de definir com mais precisão as características químicas e sensoriais dos grãos, resultando em preços mais altos que os das variedades comuns de cafeeiros. Para um grupo crescente de consumidores, a guinada aumenta o prazer de escolher entre os grãos que, cultivados e torrados de várias formas, resultam na bebida não alcoólica mais consumida no Brasil, depois da água.

“O café está seguindo o mesmo caminho do vinho, valorizando o tipo, a origem, o modo de preparo e outras características que reforçam sua identidade? comenta o geneticista Douglas Silva Domingues, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP). Ele participou da equipe internacional que fez o sequenciamento genético de C. arabica, publicado em abril na revista Nature Genetics. De acordo com esse estudo, as plantas que fornecem a maior parte do café consumido no mundo resultaram de uma fusão ?ou hibridização ?natural entre duas outras espécies, C. eugenioides e C. canephora, entre 1 milhão e 600 mil anos atrás na região que se tornou a Etiópia. Estimativas anteriores indicaram que essa união teria ocorrido há apenas 10 mil anos.

Quarto principal produto da agricultura brasileira, após soja, milho e cana-de-açúcar, e responsável por 2% do Produto Interno Bruto (PIB), o café gera 8,4 milhões de empregos diretos e indiretos, mas nem sempre em boas condições de trabalho. Segundo o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), de 1996 a 2023 foram encontrados 3.700 trabalhadores em condições análogas à escravidão em lavouras de café em todo o país. Nos primeiros seis meses de 2023, 302 pessoas foram resgatadas em fazendas de café.

O país é o primeiro produtor mundial, com 66 milhões de sacas de 60 quilogramas (kg) em 2023, o equivalente a 37% da produção global, de acordo com o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), e o segundo maior consumidor, atrás dos Estados Unidos. De acordo com uma pesquisa nacional promovida pelo Instituto Agronômico de Campinas (IAC), divulgada em novembro de 2023, quase metade (49%) dos 4.200 entrevistados (1.890 homens e 2.310 mulheres) tomava de três a cinco xícaras por dia e 29% mais de seis xícaras por dia, em casa, na rua, à espera do ônibus ou do metrô, na cafeteria com os amigos ou no trabalho.

“A pandemia da Covid-19 criou um micromundo do café, porque muitas pessoas não podiam sair e, isoladas em casa, passaram a experimentar novos tipos e formas de preparo? observa Sérgio Parreiras Pereira, engenheiro-agrônomo do IAC e mediador da Rede Social do Café (RSC), formada por quase 6 mil produtores, torrefadores, exportadores, funcionários de órgãos de governo e de universidades.

Indicações geográficas

Nos últimos anos, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) concedeu 14 indicações geográficas (IG) para o café arábica e duas para o canéfora. Esse tipo de registro reconhece características próprias de produtos e serviços diversos, resultantes do local de origem, e confere identidade, prestígio e valor a eles (ver Pesquisa FAPESP nº 309). Em novembro de 2023, um café que cresce a 1.030 metros (m) de altitude, no Cerrado de Minas Gerais, foi escolhido como o melhor do mundo em um torneio internacional. Por causa do sabor, do aroma e das técnicas de cultivo sustentável, foi selecionado por produtores de nove países ?Brasil, Costa Rica, El Salvador, Etiópia, Guatemala, Honduras, Índia, Nicarágua e Ruanda. De acordo com a Associação Brasileira da Indústria do Café (Abic), apenas 4% da produção no Brasil, um percentual bem reduzido, adota técnicas sustentáveis, cada vez mais exigidas por compradores de outros países.

“Em consequência dos cuidados pós-colheita, já produzimos cafés tão bons quanto os da Colômbia, considerados os melhores do mundo? afirma o engenheiro-agrônomo Celso Vegro, do Instituto de Economia Agrícola, vinculado à Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. Ele compara três formas dos grãos maduros, também chamados de cerejas, resultantes do tratamento pós-colheita: o café descascado, que perde a casca ao passar por uma máquina antes da secagem; lavado, que passa até dois dias fermentando em tanques com água; e o seco ao Sol, em terreiros cimentados, com a ajuda de secadores mecânicos em caso de umidade alta. Cada processo resulta em bebidas com sabores e acidez distintos. “O cereja descascado semilavado, do qual produzimos 5 milhões de sacas por safra, substitui perfeitamente o lavado colombiano? diz Vegro. “Do lavado, descascado e seco ao Sol, produzimos 1 milhão de sacas.?/p>

Catuaí vermelho do sítio Monte Alto, em São Carlos, interior paulista, e testes de secagem no IAC.

Catuaí vermelho do sítio Monte Alto, em São Carlos, interior paulista, e testes de secagem no IAC. Imagem: Léo Ramos Chaves? Revista Pesquisa FAPESP

O engenheiro-agrônomo Flávio Meira Borém, da Universidade Federal de Lavras (Ufla), em Minas Gerais, concorda: “Produzimos cafés com o mesmo nível de qualidade de qualquer outro do mundo? A seu ver, a desvantagem é o marketing, que construiu a imagem de alta qualidade do café colombiano. “Em um teste às cegas com amostras do Brasil, da Colômbia e da Etiópia, o nosso se destaca, mas, diante das embalagens, o consumidor vai achar que o da Colômbia é melhor. Mas não é. Da produção da Colômbia, de 11,5 milhões de sacas na safra 2022/2023, pelo menos a metade é de cafés finos, colhidos a mão e apenas os grãos maduros, sem os verdes, que prejudicam o sabor, enquanto no Brasil, no máximo 10% são de cafés especiais, também chamados de finos; a maioria da produção brasileira é de grãos de menor qualidade.

Talvez aos poucos esse cenário mude. “À medida que a produção se eleva, a tendência é aumentar o esforço na obtenção de maiores percentuais de cafés de melhor qualidade em detrimento dos mais básicos? pondera Vegro. Segundo ele, o espaço para os cafés finos se expande também à medida que mais pessoas aprendem a apreciar versões de qualidade mais alta.

Conceitos refeitos

Em meio às pesquisas científicas que permitiram esses avanços, algumas ideias antigas estão se desfazendo. Por exemplo: as duas variedades de C. canephora, conilon e robusta, consideradas menos refinadas que C. arabica, também podem render cafés com boa avaliação sensorial ?de até 89 pontos em uma escala de 100. Em experimentos feitos na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), os grãos de canéfora liberaram aromas de rosas, canela e amoras após passarem por uma fermentação longa (de cinco dias para conilon e 15 para robusta) e, no caso do conilon, também promovida com a levedura Saccharomyces cerevisiae. O canéfora é bastante usado para produzir cafés solúveis e para reduzir a acidez da bebida, quando misturado com o arábica.

“A fermentação é uma alternativa para os produtores diversificarem o perfil sensorial dos cafés? comenta Borém. Para o arábica, as melhores qualidades sensoriais foram obtidas com a fermentação durante dois a quatro dias, com a bactéria Lactobacillus plantarum e com S. cerevisiae, de acordo com um trabalho realizado na Ufla que será publicado na edição de junho deste ano na Food Chemistry.

“Vários produtores do norte do Espírito Santo já fazem cafés fermentados, com ou sem levedura? comenta a engenheira de alimentos Bárbara Zani Agnoletti, principal autora de um estudo de novembro de 2022 na Microchemical Journal que detalha as possibilidades de enobrecimento do canéfora. O chamado robusta amazônico, cultivado em Rondônia e no Amazonas, tem conquistado consumidores em razão do aroma e do sabor, resultantes da fermentação natural ou induzida (ver Pesquisa FAPESP nº 282).

A qualidade resulta do esmero em cada etapa da produção

A qualidade resulta do esmero em cada etapa da produção. Imagem: Léo Ramos Chaves? Revista Pesquisa FAPESP

Com seu grupo, Borém desfez outro preceito: é possível fazer cafés finos, que recebem pelo menos 80 pontos na escala de 100, com grãos verdes, normalmente vistos com ressalvas, por prejudicarem o sabor. Com financiamento da multinacional chinesa Syngenta, a equipe da Ufla desenvolveu uma técnica para formular um café com 50% de grãos verdes e 50% maduros. “O fruto verde pode ser colhido mais cedo, tem mais antioxidantes e seu gosto desagradável dá para ser eliminado por meio de um pacote tecnológico? diz ele, sem detalhar porque a tecnologia se encontra em fase de licenciamento.

Outra ideia que caiu por terra: cafés arábica especiais podem frutificar não apenas em terras altas, acima de 1,2 mil m, mas também nas baixas, desde que o solo contenha uma proporção específica de um derivado de óxido de ferro, detectado por um grupo da Universidade Estadual Paulista (Unesp) (ver Pesquisa FAPESP nº 336). Essa informação desfaz a regra de que apenas altitudes mais elevadas poderiam propiciar grãos com aroma frutado combinado com especiarias, enquanto as áreas de altitudes menores seriam as únicas a prover grãos que exalam aromas de citros, chocolate ou nozes depois de torrados e moídos com zelo.

Inovações em campo

Continuamente, os centros de pesquisa apresentam propostas de melhorias no plantio, na colheita ou no beneficiamento dos grãos. Em novembro de 2023, o IAC concluiu uma pesquisa de 30 anos coordenada pelo engenheiro-agrônomo Oliveiro Guerreiro Filho e lançou um porta-enxerto (raiz e base do caule), resultante da combinação de cinco variedades de C. canephora, resistente a vermes nematoides, que causam perdas estimadas em 20% da produção nacional. Sobre o porta-enxerto pode ser implantado um caule, que será a copa da planta e produzirá o café da variedade desejada.

Há quase 13 anos, no início de uma tarde de agosto de 2011, o engenheiro-agrônomo Gerson Silva Giomo, coordenador do programa de cafés especiais do IAC, apontou para uma série de cafeeiros miúdos e desgrenhados. “Quem disse que esses pés feios, pequenos e com poucos frutos não podem produzir café de qualidade?? perguntou. “Quanto mais diferentes são as plantas, maior a chance de encontrar frutos com características sensoriais que interessem para os produtores e apreciadores?(ver Pesquisa FAPESP nº 187).

Em fevereiro deste ano, o pesquisador contou que, com sua equipe, selecionou algumas daquelas plantas, produziu centenas de mudas por meio de cultura de tecidos (já que eram híbridas e não se multiplicavam por meio de sementes) e as plantou em áreas de clima, altitude e solo diferentes, nos estados de São Paulo e Minas Gerais. Após três safras, destacaram-se três grupos de plantas aptas a produzir cafés especiais distintos, que recebem uma pontuação mínima de 87 pontos na escala de classificação da Specialty Coffee Association (SCA). Os cafeeiros resultam do cruzamento de variedades que saíram da Etiópia, como a geisha, que origina cafés de qualidade, do Panamá, e outras de arábica, como catuaí e obatã, que asseguram a produtividade.

Alexandre Affonso/Revista Pesquisa FAPESP

Imagem: Alexandre Affonso/Revista Pesquisa FAPESP

“As novas variedades já estão prontas para serem produzidas em larga escala por empresas especializadas e depois ir para os cafeicultores? diz ele. “Como validamos o método de produção de mudas a partir de células da folha, a embriogênese somática, podemos agora ganhar tempo em cruzamentos entre outras variedades.?/p>

Na Embrapa Instrumentação, em São Carlos, interior paulista, o cientista da computação Ednaldo José Ferreira está na fase final dos testes de um sistema que poderá facilitar o trabalho dos provadores, responsáveis pela classificação da bebida, com base em aroma (odores associados ao sabor), acidez, fragrância (odores que não podem ser provados, como madeira ou metal) e amargor. É o CoffeeClass, sistema dotado de um microscópio digital que amplia até 200 vezes uma imagem de grãos torrados e moídos, em seguida, mede o espectro da luz fluorescente ou refletida e, usando inteligência artificial, classifica a amostra em uma das quatro classes de qualidade adotadas pela Abic, em ordem decrescente: gourmet (incluindo especial), superior, tradicional/extraforte e não recomendável.

“Por análise sensorial, um gourmet, com um amargor típico e baixa adstringência [sensação de contração e ressecamento na língua, como a causada quando ingerimos banana ou caqui verdes], pode ser interpretado como um superior, e vice-versa, se estiver com um nível de qualidade próximo ao limite que separa as duas classes? explica Ferreira. Segundo ele, o novo método fornece uma classificação mais clara por reconhecer os grãos defeituosos que prejudicam a qualidade do café.

Em janeiro, depois de analisar em teste cego 20 amostras fornecidas pela Abic, com uma margem de acerto de 75%, Ferreira começou a trabalhar com uma amostragem maior, de 230 cafés de diferentes regiões do país. Seu objetivo é fazer a validação do CoffeeClass, etapa prévia ao licenciamento e à produção em escala comercial de versões portáteis do equipamento, para uso de produtores e lojistas.

Na Ufes, Agnoletti utilizou a espectroscopia na região do infravermelho, uma das formas de medir a intensidade de luz absorvida por uma substância, para examinar o terroir, a identidade sensorial de uma bebida, definida pela composição química resultante da interação entre genética, clima, solo e cuidados pós-colheita. Ela analisou amostras das variedades conilon, robusta e híbridos de C. canephora colhidas em 2021 em diferentes regiões do país: 60 do Espírito Santo, 153 de Rondônia, 24 da Bahia, 15 de Minas e 10 de São Paulo, todas preparadas do mesmo modo.

Nesse trabalho, detalhado em janeiro na Food Research International, a genética de cada variedade pesou mais na construção do terroir do que o local de cultivo. Cafés de São Paulo, Minas e Bahia não apresentaram terroir, aproximando-se dos de Espírito Santo e Rondônia. A razão? Segundo Agnoletti, provavelmente as variedades, levadas de uma região para outra, não tiveram tempo de se diferenciar. “Essa técnica de análise poderia ajudar a autenticar, diferenciar ou agrupar os terroirs, que são a base das indicações geográficas? diz ela.

Na Ufla, o engenheiro-agrônomo Luiz Roberto Guimarães Guilherme tem usado um espectrofotômetro de fluorescência portátil, um tipo de sensor de raios X, para avaliar em segundos os principais componentes de solos, os insumos usados na produção e o estado nutricional das folhas dos cafeeiros que crescem em lotes experimentais no sul de Minas Gerais, facilitando as análises, até agora feitas em laboratório. “Os produtores ficam animados, porque veem na hora as áreas cuja adubação precisam corrigir, e querem comprar um equipamento igual? ele relata.

Microscópio digital do CoffeeClass, sistema capaz de reconhecer defeitos em grãos torrados e moídos, desenvolvido na Embrapa Instrumentação

Microscópio digital do CoffeeClass, sistema capaz de reconhecer defeitos em grãos torrados e moídos, desenvolvido na Embrapa Instrumentação. Imagem: Léo Ramos Chaves? Revista Pesquisa FAPESP

Como um aparelho desse tipo é importado e de alto custo, sua equipe examina a possibilidade de utilizar e até produzir outros sensores que realizem análises semelhantes. Já em desenvolvimento se encontra um aplicativo para celular que dará informações, ainda que simplificadas, sobre o estado nutricional da planta por meio de fotos das folhas. Em laboratório, Guilherme está avaliando um nariz eletrônico, com sensores para gases, para avaliar os aromas e a qualidade dos grãos torrados e moídos. Artigos publicados em 2023 nas revistas Environmental Research e Chemosphere detalham os avanços no uso dos sensores.

“O café tem uma proporção de genes associados ao aroma maior que a média de outras plantas? comenta Domingues, da USP. Ele participou de um trabalho coordenado pela empresa suíça Nestlé comparando os genomas de C. arabica e das duas espécies das quais se originou, C. eugenioides e C. canephora. “Vimos uma expansão no número de genes relacionados a um grupo de enzimas, as terpeno sintases, que produzem os terpenos, associados ao gosto e ao odor dos frutos, e identificamos quais delas são ativas no fruto verde e no fruto maduro, influenciando a qualidade? comenta.

Esse trabalho foi divulgado como preprint em novembro de 2023 no repositório bioRxiv, marcando a competição científica entre os maiores fabricantes de café: em janeiro, a Nature Communications publicou o genoma de uma variedade de C. arabica, a Bourbon, originária da Etiópia e cultivada em muitos países ?no Brasil, no Cerrado mineiro ? que se destaca pela doçura, aroma frutado e sabor achocolatado. Financiado pela empresa italiana Illy, esse trabalho mostrou que as sutis variações de gosto e aroma em uma mesma variedade resultavam da troca, eliminação ou reorganização de genes.

Para Domingues, ainda há muito a ser feito, porque a pesquisa básica em genética sobre café no Brasil desacelerou, após o trabalho dos pioneiros em melhoramento genético, entre eles os engenheiros-agrônomos Carlos Arnaldo Krug (1906-1973) e Alcides Carvalho (1913-1993), ambos do IAC, e a ênfase é a pesquisa aplicada. “Há muito mais pesquisa sobre a genética básica de cana-de-açúcar do que sobre café atualmente? observa. Mas, passo a passo, tornam-se mais evidentes quais os genes e as condições de cultivo e de preparo que fazem um bom café.

A reportagem acima foi publicada com o título ?strong>Novos sabores à sua escolha?na edição impressa nº 340, de junho de 2024.

Projetos
1.
Da semente à xícara: Internet das coisas na cadeia produtiva de cafés de qualidade (no 21/06968-3); Modalidade Projeto Temático; Convênio MCTI; Pesquisador responsável Luiz Roberto Guimarães Guilherme (Ufla); Investimento R$ 844.768,54.
2. Preenchendo lacunas entre recursos biológicos no gênero Coffea e os novos desafios do melhoramento frente às mudanças globais: Bridges-coffea (no 23/03353-3); Modalidade Auxílio à Pesquisa ?Regular; Pesquisador responsável Douglas Silva Domingues (USP); Investimento R$ 510,00.
3. Uma abordagem sistêmica para compreensão do impacto de mudanças climáticas em Coffea (no 18/08042-8); Modalidade Auxílio à Pesquisa ‒Regular; Pesquisador responsável Douglas Silva Domingues (USP); Investimento R$ 367.538,11.
4. Descritores químicos e tecnologias verdes emergentes em combinação com quimiometria para caracterização e avaliação de cafés finos do Brasil (no 19/21062-0); Modalidade Bolsa de Doutorado; Pesquisadora responsável Juliana Azevedo Lima Pallone (Unicamp); Bolsista Michel Rocha Baqueta; Investimento R$ 376,69.

Artigos científicos
AGNOLETTI, B. Z. et al. Effect of fermentation on the quality of conilon coffee (Coffea canephora): Chemical and sensory aspects. Microchemical Journal. v. 182, 107966. nov. 2022.
AGNOLETTI, B. Z. et al. The terroir of Brazilian Coffea canephora: Characterization of the chemical composition. Food Research International. v. 176, 113814. jan. 2024.
ANDRADE, R. et al. Proximal sensing provides clean, fast, and accurate quality control of organic and mineral fertilizers. Environmental Research. v. 236, 116753. 1º nov. 2023.
BENEDET, L. et al. Clean quality control of agricultural and non-agricultural lime by rapid and accurate assessment of calcium and magnesium contents via proximal sensorsEnvironmental Research. v. 221, 115300. 15 mar. 2023.
DA COSTA, M. V. et alTowards direct and eco-friendly analysis of plants using portable X-ray fluorescence spectrometry: A methodological approach. Chemosphere. v. 339, 139613. out. 2023.
SALOJÄRVI, J. et al. The genome and population genomics of allopolyploid Coffea arabica reveal the diversification history of modern coffee cultivars. Nature Genetics. v. 56, p. 721-31. 15 abr. 2024.
RABELO, H. S. et al. Fermentation of coffee fruit with sequential inoculation of Lactiplantibacillus plantarum and Saccharomyces cerevisiae: Effects on volatile composition and sensory characteristics. Food Chemistry. v. 444, 138608. 30 jun. 2024.
SALVIO, L. G. A. et al. Fermented natural coffee followed by pulping: Analysis of the initial sensory quality and after six months of storageCoffee Science. v. 18, e182120. 1º set. 2023.
SALOJÄRVI, J. et al. The genome and population genomics of allopolyploid Coffea arabica reveal the diversification history of modern coffee cultivars. Pré-print. bioRxiv. 11 nov. 2023.
SCALABRIN, S. et al. A chromosome-scale assembly reveals chromosomal aberrations and exchanges generating genetic diversity in Coffea arabica germplasmNature Communications. v. 15, n. 463. 23 jan. 2024.

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????? ???? ???? ??? ?? //emiaow553.com/alimentacao-de-suinos-com-suplemento-de-bagaco-de-uva-produz-carne-mais-vermelha-saudavel-e-macia/ Tue, 12 Mar 2024 12:23:02 +0000 /?p=556332 Porcos receberam suplementação de bagaço de uva em ração, animais livres e confinados foram avaliados durante quase três meses

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Texto: Agência Bori

Highlights

  • Pesquisadores avaliaram suplementação de bagaço de uva em alimentação de suínos criados em diferentes sistemas de produção
  • Suplementação não alterou ácidos graxos e colesterol da carne e permitiu uma maior duração da carne sob refrigeração
  • Uso de bagaço de uva na ração de suínos pode reduzir custos do produtor e ser alternativa sustentável em regiões vinícolas do RS

Pesquisadores da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) constataram que suplementar a alimentação de suínos de corte com bagaço de uva pode ser uma alternativa para uma produção mais sustentável, mantendo a qualidade da carne desses animais. A pesquisa, publicada na segunda (4) na revista “Anais da Academia Brasileira de Ciências?/a>, também indica que essa suplementação gera uma carne mais saudável e macia para o consumidor.

O trabalho avaliou os efeitos da suplementação da dieta de suínos com bagaço de uva, resíduo comum da produção vinícola do Rio Grande do Sul. Para os experimento, foram utilizados resíduos de bagaço de uva da Cooperativa Agrária São José de Vinhos Jaguari, da cidade de Jaguari, na região central do estado. Os resíduos foram preservados como silagem, uma forma de armazenamento em silos com ausência de ar. Esse material foi misturado na ração dos animais na proporção de 200 gramas para cada quilo em base seca, que pode ser o milho, por exemplo.

Ao todo, 48 suínos que receberam e não receberam a dieta foram avaliados ao longo de 84 dias. Esses animais foram criados em ambientes confinados e ao ar livre, com e sem acesso à vegetação. Os pesquisadores analisaram aspectos como a qualidade, textura e coloração da carne dos animais após o abate e também fizeram uma análise mais abrangente dos efeitos da dieta na carne suína, avaliando o teor de colesterol e o perfil de ácidos graxos. Voluntários treinados também foram convocados para provar o produto.

Os resultados indicam que o perfil de ácidos graxos e colesterol não se modificaram com a suplementação, em comparação às taxas dos animais alimentados com dieta à base de soja e milho. Por outro lado, a inclusão de antioxidantes provenientes do bagaço de uva promoveu uma melhoria na qualidade da carne, tornando-a mais saudável. Houve, também, uma diminuição na oxidação lipídica das carnes armazenadas sob refrigeração, o que aumentou seu tempo de duração.

Outro destaque é que a carne dos animais suplementados com bagaço de uva foi considerada mais macia pelos provadores durante a análise sensorial do produto, o que foi confirmado pela análise de textura. Caroline Giuliani, da UFSM e autora do artigo, explica que “o consumidor final se beneficia com uma carne mais saudável devido aos antioxidantes presentes nos resíduos da uva. Além disso, o bagaço da uva torna a carne mais vermelha e mais macia.?/p>

A pesquisadora destaca, ainda, que o uso do bagaço pode ser vantajoso para os produtores de suínos. O resíduo descartado pelas vinícolas não tem custos, ao contrário das rações para animais compostas por milho e soja, sujeitas a variações de preço destes cereais. “O bagaço de uva reduz os custos para o produtor com a alimentação animal, sem alterar a qualidade da carne, além de gerar um produto mais sustentável? complementa.

Com seus vinhos e espumantes reconhecidos, o Rio Grande do Sul é líder vitivinícola do Brasil, englobando as duas principais regiões produtoras do setor: a Serra e a Campanha Gaúcha, respectivamente. Com uma produção anual média de mais de 876 toneladas de uva, seus resíduos somam cerca de 25% da quantidade processada.

Os resultados da pesquisa agora podem ser considerados para uma implementação do uso de resíduos de uva em larga escala nas indústrias vinícola e suína, segundo Giuliani, visto que oferecem uma alternativa para tornar essas produções mais sustentáveis. “As vinícolas brasileiras geram grandes volumes de resíduos, muitas vezes descartados sem tratamento, o que impacta o meio ambiente? observa a pesquisadora. Por isso, “utilizar esses resíduos na alimentação animal proporciona um destino sustentável e um aproveitamento adequado para eles?

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