Spray nasal à base de anestésico pode ser aprovado em breve nos EUA para tratar depressão

Painel de especialistas convocado pela Food and Drug Administration dá sinal verde para que o órgão aprove o desenvolvimento da droga pela Johnson & Johnson
Teresa Crawford/AP
Um dos maiores obstáculos para a cetamina (um tipo de anestésico) se tornar um tratamento popular contra a depressão pode ter sido superado.

Na terça-feira (12), um painel de especialistas independentes pela Food and Drug Administration (órgão norte-americano equivalente à Anvisa) discutiu se uma versão em spray nasal da droga desenvolvida pela Johnson & Johnson deveria ser aprovada pela FDA.

Em uma votação majoritária, eles concordaram que os benefícios da droga superavam seus riscos no tratamento de casos de depressão que não responderam a outros tratamentos, embora não sem algumas condições. A votação praticamente sinaliza a eventual aprovação da droga, já que a FDA raramente se desvia dessas decisões.

A cetamina tem tido uma história complicada. Originalmente e ainda usada como sedativo para pessoas e animais, ela é também uma droga comum para festas, já que pode causar um barato eufórico e desorientador. Há anos, porém, os médicos têm experimentado com o uso de pequenas doses de cetamina como um tratamento para a depressão.

O que fez da cetamina tão atraente como um antidepressivo é que seus efeitos em aumentar o humor parecem dentro de horas ou até mesmo minutos, enquanto outros antidepressivos podem levar semanas para funcionar. Essa ação rápida é para as pessoas no meio de uma crise imediata e que estejam tendo dificuldades com ideias suicidas.

Atualmente, no entanto, o tratamento da depressão é feito com cetamina, mas em medicamentos não regulamentados. A substância também é geralmente aplicada por meio de terapia intravenosa em clínicas especializadas. Portanto, tem sido difícil para as pessoas terem acesso à droga. A natureza de pequena escala do tratamento com cetamina também dificultou a comprovação de que a droga realmente pode ser eficaz para a depressão. A versão da Johnson & Johnson da droga, se ganhar a aprovação da FDA, aparentemente resolveria essas questões. Além de ser mais conveniente como um spray nasal, a alternativa da empresa é baseada na esketamina, que é quimicamente semelhante. A Johnson & Johnson esperava que a esketamina iria causar menos efeitos colaterais como sedação ou dissociação, ao mesmo tempo em que forneceria um efeito antidepressivo parecido. A FDA também tinha suas esperanças depositadas na droga, concedendo-lhe uma designação de “Terapia Inovadora”, um que acelera a revisão de um tratamento potencial para uma condição grave ou de risco de vida.

Entretanto, não era necessariamente garantido que a droga da J&J seria recomendada para aprovação. Dos cinco ensaios clínicos de Fase III (o padrão de ouro de evidências), apenas dois estudos mostraram que a esketamina teve melhor desempenho que um placebo. Um desses ensaios envolveu adultos com menos de 65 anos que receberam doses variáveis do medicamento; o outro foi um ensaio de abstinência randomizado, em que voluntários são selecionados aleatoriamente para deixar o medicamento ou continuar o tratamento (em todos os ensaios, os pacientes estavam tomando pelo menos um outro antidepressivo). A maioria dos antidepressivos aprovados pela FDA, observou o painel, tinha evidências de pelo menos dois ou mais estudos de Fase III, não incluindo um estudo de abstinência randomizado. Por fim, no entanto, o painel de 17 membros votou esmagadoramente a favor da aprovação, com 14 votando “sim”, dois, “não”, e um se abstendo. Explicando suas razões, o membro do painel Walter Dunn, professor de psiquiatria da Universidade da Califórnia em Los Angeles, chegou ao ponto de chamar a droga de “divisora de águas” para o tratamento da depressão. Um fator importante que influenciou muitos dos votos “sim” foi a da FDA de como aprovaria a droga, se o fizesse. Nos ensaios, os pacientes estavam mais propensos a sofrer efeitos colaterais dentro de duas horas após uma dose. Assim, a FDA propôs que provavelmente aprovaria que o medicamento fosse tomado apenas em determinados ambientes de cuidados de saúde, onde os pacientes poderiam ser supervisionados por duas horas. As doses supervisionadas seriam parte de um programa maior de “Avaliação de Risco e Estratégia de Mitigação” — ou REMS, na sigla em inglês — para o medicamento. A dosagem de cetamina dada para a depressão é normalmente muito menor do que o que as pessoas usam para recreação. Mas os médicos ainda estão preocupados com o risco de abuso da substância, apontando de pacientes que se tornam dependentes da droga. As restrições sobre como a esketamina será tomada, disse a FDA, ajudariam a prevenir o uso indevido. Como proposto atualmente, a esketamina seria dada duas vezes por semana em uma clínica durante as primeiras quatro semanas, junto com um outro novo antidepressivo oral e, em seguida, semanalmente durante as quatro semanas seguintes. Depois disso, os pacientes podem ficar em uma programação semanal ou mudar para a cada duas semanas, pelo tempo que for necessário, mas eles sempre receberiam suas doses sob supervisão.

Os membros do painel que votaram “sim” e “não” enfatizaram a necessidade de se realizar mais pesquisas sobre os efeitos da droga, mesmo que ela ganhe aprovação. Algumas evidências têm mostrado que as pessoas que abusam da cetamina ou a usam indevidamente podem, , desenvolver danos cerebrais permanentes. E, embora não tenha havido nenhum sinal desse efeito nos estudos com seres humanos ou animais, muitos especialistas mencionaram a falta de pesquisa que descartaria a possibilidade desse ou de outros riscos sérios à saúde que possam ocorrer com a cetamina se esta se tornasse uma opção aprovada e de longo prazo para tratar a depressão.

Ainda assim, agora parece provável que a droga da Johnson & Johnson ganhará a aprovação da FDA, o que a tornaria o primeiro novo tipo de tratamento para depressão aprovado pela agência em décadas, desde a chegada do Prozac em 1986 (e apenas o segundo medicamento já aprovado para depressão resistente ao tratamento desde a aprovação da combinação olanzapina/fluoxetina em 2009). Embora a FDA não seja obrigada a ouvir os conselhos de seus comitês consultivos, ela raramente descartou essa opinião nos últimos anos. Uma decisão final sobre a aprovação da droga poderá chegar já em março.

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