O que é o Procon e o que ele pode fazer em casos como o do iPhone sem carregador?
O Procon pode obrigar uma empresa? Pode multar? E se o Procon estiver errado, como fica? Essas e outras perguntas estão respondidas aqui.
Nas últimas semanas, a história de a Apple vender seus iPhones sem carregador deixou o estágio de para tomar contornos mais oficiais. O Procon-SP e o notificaram a empresa por causa dessa nova política, e o caso ganhou repercussão até na imprensa estrangeira.
Mas, afinal de contas, o que o Procon pode ou não pode fazer em casos como este? Na prática, o que significa uma notificação desse tipo? Para entender melhor, o Gizmodo Brasil conversou com o Procon-SP e com três advogados especializados em Direito do Consumidor.
O Procon não faz parte da Justiça
Para começo de conversa, é preciso entender que não existe só um Procon. “Todos os estados do território nacional e também o Distrito Federal têm Procons instalados e atuantes. Alguns municípios também contam com entidades de competência limitada ao território municipal. Os Procons se inserem no Sistema Estadual e Municipal de Defesa do Consumidor”, explica Marco Antonio Araújo Júnior, advogado e diretor do Instituto Brasilcon.
Como explica a assessoria do Procon-SP, a natureza jurídica de cada um pode variar: alguns são autarquias de atuação independente, outros são ligados ao Ministério Público ou à Assembleia Legislativa.
Também é preciso entender que o Procon é um órgão administrativo e extrajudicial. Portanto, ele não faz parte do Poder Judiciário nem do Poder Legislativo. “Ele não tem o poder de emitir sentenças, porque quem faz isso é o Judiciário”, explica o advogado Leandro Nava, especialista em Direito do Consumidor e professor do Senac e da FMU.
Araújo comenta que o órgão é um “meio alternativo para a solução de conflitos entre consumidor e fornecedor”. Sua atuação também pode ser educativa, levando a população a conhecer seus direitos. O Procon não cria regras, no máximo orientações que indiquem a tendência de agir de cada entidade.
“As únicas normas emanadas do órgão são as de funcionamento interno e as de procedimentos administrativos, tais como: parâmetros para aferição de multas, estabelecimento de novos prazos procedimentais e recursos administrativos”, diz a assessoria do Procon-SP.
Como explica Bruno Boris, professor de Direito do Consumidor da Universidade Presbiteriana Mackenzie de São Paulo, o próprio Código de Defesa do Consumidor dá margem para que os órgãos de fiscalização e juízes atuem sobre práticas abusivas, mesmo que elas não estejam exemplificadas na lei.
O Procon pode fiscalizar e multar, mas não pode julgar
Mas o que o Procon pode fazer? Ele não precisa esperar a reclamação de um consumidor para agir e, apesar de não poder julgar e condenar uma empresa, tem alguns poderes: pode fechar estabelecimentos, proibir a venda de produtos e aplicar multas, por exemplo. “Caso seja constatado que o fornecedor tenha praticado crime, o Procon poderá oficiar a autoridade policial, que será responsável pela averiguação da prática criminosa”, explica Araújo.
Como Boris lembra, o valor de uma multa pode chegar a quase R$ 3 milhões, dependendo do tamanho da companhia. “Tem muita empresa que não dá muita importância, mas a caneta do Procon é pesada.”
Mesmo assim, o órgão não tem poder coercitivo. “Ele não pode obrigar uma empresa a trocar um celular sob pena de multa diária, como um juiz pode fazer”, comenta o professor. “Mas aplica uma multa de acordo com a conduta da companhia em relação ao Código de Defesa do Consumidor.”
Como Boris ressalta, vale dizer que o dinheiro recebido com as multas aplicadas vão para o Estado, não para o consumidor que fez a reclamação. O professor também comenta que o órgão geralmente não costuma entrar em áreas que tenham outros órgãos com competências estabelecidas — uma questão de telefonia, por exemplo, pode ser encaminhada para a Anatel, enquanto questões envolvendo restaurantes ficariam a cargo da vigilância sanitária.