Processo faz peptídeo adquirir estrutura similar à encontrada em doenças neurodegenerativas
Texto: Luciana Constantino | Agência FAPESP
Os peptídeos são biomoléculas formadas pela ligação entre dois ou mais aminoácidos que apresentam importantes funções no organismo humano, como as de hormônios, neurotransmissores, analgésicos e até antibióticos. Por esse motivo são muito estudados e usados pela indústria farmacêutica, por exemplo.Pela inovação e importância, o foi destaque na capa da revista científica Biochemistry. Recebeu apoio da FAPESP por meio de dois projetos ( e ).
O grupo examinou in vitro o mecanismo de transformação do aminoácido glutamina (Gln) em seu derivado cíclico piroglutâmico (Pyr), quando presente uma sequência peptídica ou proteica na extremidade N-terminal (uma das pontas da molécula). Esse processo ocorre via deamidação, isto é, a eliminação de um composto químico, o NH3 (amônia). Todas as proteínas são constituídas por 20 tipos de aminoácidos, unidos por ligações peptídicas – o que varia é o número e a sequência dos aminoácidos.
“O resultado pode servir de modelo para muitos pesquisadores que trabalham com peptídeos. Conseguimos dois achados. Voltamos a um tema antigo, que é a degradação da glutamina em piroglutâmico, mas alertamos para a importância da análise da sequência. E a segunda questão foi destacar que, após a transformação do peptídeo, as características mudam, com tendência de ele se atracar a membranas. Com o piroglutâmico, a molécula passa a ter a propriedade de formar agregados amiloides, como se fossem conglomerados típicos encontrados em pacientes com doenças neurodegenerativas. Essas placas amiloidais se depositam no cérebro e interrompem o fluxo de neurônios”, explica o professor do Departamento de Biofísica , orientador do estudo.
Degraus da pesquisa
“Por ser cíclico e com uma carga positiva a menos, o Pyr-peptídeo seria mais hidrofóbico que o nativo e, assim, antevíamos maior chance de interação do análogo com sistemas membrana-miméticos. O que não esperávamos era que esse análogo mostrasse a formação de estruturas amiloidais, do tipo existentes em portadores de doenças neurodegenerativas. Não chegamos a estudar a doença, mas é um caminho que se abre”, afirma à Agência FAPESP o também professor do departamento .
Silva é autor correspondente do artigo, juntamente com Nakaie, que ressalta a importância das modificações pós-translacionais que ocorrem no organismo e envolvem a cadeia polipeptídica. Essas modificações desempenham papel na diversidade funcional das proteínas e permitem que uma sequência de aminoácidos codificada em um gene seja adaptada para várias funções e regulações. “Dentro desse contexto, certamente o fator tempo estará, no fundo, sempre conjugado com a ocorrência das modificações, independentemente do local ou da velocidade de cada uma delas em nosso organismo. Portanto, o conceito do relógio da vida adquire sentido e foi por essa razão que propusemos a ampulheta com a transformação espontânea de Gln em Pyr como ilustração para a capa da revista”, diz Nakaie. Professor na Escola Paulista de Medicina há 45 anos, ele destaca o pioneirismo do Departamento de Biofísica ao introduzir no Brasil o desenvolvimento de projetos na área de síntese e bioquímica de peptídeos, incluindo derivados de aminoácidos. “Com certeza, nossos achados abrem caminhos para outros estudos. Depois da conclusão do trabalho envolvido no doutorado da Mariana, também queremos dar seguimento a essa linha de pesquisa”, conclui Nakaie.O artigo Pyroglutamination-Induced Changes in the Physicochemical Features of a CXCR4 Chemokine Peptide: Kinetic and Structural Analysis pode ser lido em: .