Geologia: Rios extintos do Nordeste
Texto: Carlos Fioravanti/
Quem anda pela região de Sobral e Juazeiro do Norte, no Ceará, de Catimbau, em Pernambuco, ou Monsenhor Hipólito, no Piauí, provavelmente encontra arenitos, rochas amareladas resultantes da aglutinação da areia. Suas camadas indicam que por ali, há milhões de anos, correu um rio. Além disso, nas áreas hoje planas ao sul, ocupadas pelos estados de Sergipe, Alagoas, Bahia e Pernambuco, havia montanhas de 3 mil a 4 mil metros (m).Segundo Cerri, os rios desapareceram – e foram cobertos por gelo – em razão de uma intensa glaciação no final do período geológico Ordoviciano, entre 445 milhões e 443 milhões de anos atrás, como detalhado em um artigo publicado em abril de 2022 na Geological Magazine e outro da edição de julho da Gondwana Research.
“Há muito se discutia se os sedimentos de rios da bacia do Parnaíba, nos estados do Piauí, Maranhão e Ceará, teriam a mesma origem dos de outras bacias do Nordeste”, diz Cerri. “Estudando o zircão, mostramos que todas as unidades sedimentares poderiam, sim, ter a mesma idade e ter se formado do mesmo modo.” O geólogo David Vasconcelos, da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), que não participou do trabalho, mas estuda as bacias sedimentares do Nordeste, considera essa hipótese válida: “As unidades geológicas mais antigas das bacias sedimentares do Nordeste podem realmente ter tido uma origem comum, apesar dos diferentes nomes regionais do mesmo tipo de arenito”. Segundo Vasconcelos, há 480 milhões de anos, os rios das bacias atualmente isoladas poderiam estar integrados na chamada depressão afro-brasileira, formada pelo atual Nordeste brasileiro e pelo oeste da África, e seria maior que a rede hidrográfica da Amazônia.“Há uma coerência das informações coletadas, mas não se pode descartar a priori que as bacias do Nordeste tiveram fontes de sedimentos provenientes de vários lugares, porque rochas de mesma idade podem ocorrer em diferentes locais”, observa o geólogo Ticiano dos Santos, do Instituto de Geologia da Universidade Estadual de Campinas (IG-Unicamp). O pesquisador também não participou do trabalho de Cerri e estuda a história geológica ainda mais antiga da região, com pelo menos 550 milhões de anos, especialmente no Ceará. “Na foz do Amazonas, por exemplo, há zircões de todas as idades, vindos dos Andes e de áreas mais antigas que ocorrem ao longo do rio Amazonas.”
Já conhecidas dos geólogos, as montanhas do atual Nordeste brasileiro se formaram em áreas antes ocupadas pelo mar, em consequência do encontro de blocos rochosos da litosfera (a camada superficial da Terra) que se deslocavam em sentido contrário. Uma das áreas altas, a faixa Sergipana, atualmente abrange o estado de Sergipe e parte da Bahia e de Alagoas. Outra, a faixa Riacho do Pontal, ocupa a região limítrofe entre os estados da Bahia, de Pernambuco e do Piauí, na margem norte do cráton São Francisco – cráton é um bloco de rochas antigo que se estende por centenas de quilômetros. Quem anda pelo interior do Nordeste e não conhece muito de geologia deve tomar cuidado com conclusões apressadas. A Chapada do Araripe, por exemplo, ainda que esteja a mil metros de altitude e tenha 178 km de extensão, não é o resquício de uma montanha, mas o resultado da compressão das estruturas rochosas mais densas que a cercam.Projetos
1. Geocronologia e proveniência das sucessões basais das bacias do Parnaíba, Araripe, Jatobá e Tucano Norte: Implicações para a origem das bacias intracontinentais do SW Gondwana (); Modalidade Bolsas de Pós-doutorado; Pesquisador responsável Lucas Verissimo Warren (Unesp); Bolsista Rodrigo Irineu Cerri; Investimento R$ 271.323,36.
2. Análises U-Pb e de proveniência sedimentar em rutilos por LA-ICP-MS nas sequências paleozoicas da província Borborema: Bacias do Parnaíba, Araripe e Tucano-Jatobá (); Modalidade Bolsa de Pós-doutorado; Pesquisador responsável Lucas Verissimo Warren (Unesp); Bolsista Rodrigo Irineu Cerri; Investimento R$ 156.768,04.
Artigos científicos
CERRI, R. I. et al. . Gondwana Research. v. 131, p. 237-55. jul. 2024.
CERRI, R. I. et al. . Geological Magazine. v. 159, n. 7. 6 abr. 2021.
GOMES, N. G. et al. . Lithos. v. 446-7, 107138. jun. 2023.