Eles são incríveis e cabem na palma da mão: conheça 5 relíquias da coleção de insetos do Butantan
Reportagem: Natasha Pinelli/Instituto Butantan
1. Mutucas anciãs
Capturados em 1902, quatro exemplares centenários de mutucas da família Tabanidae são os espécimes mais antigos da coleção. Provenientes da capital paulista, de Mogi das Cruzes, Ribeirão Preto e Batatais – todas cidades localizadas no estado de São Paulo –, as coletas foram realizadas em expedições do renomado sanitarista Adolpho Lutz. Especializado em medicina tropical, o médico carioca desenvolveu trabalhos pioneiros para o combate e controle de doenças endêmicas e epidêmicas do século XX, entre elas cólera, febre amarela, febre tifoide e malária.2. Uma caixa de charutos, centenas de moscas
Foi durante uma de suas diversas empreitadas de organização do acervo que o biólogo e técnico de laboratório Eli Oliveira se deparou com um objeto para lá de curioso: uma caixa de charutos de madeira, com as inscrições Stender & Co estampada na tampa. “Fiquei muito surpreso ao abrir, pois me deparei com exatos 298 espécimes, entre eles uma aranha da família Salticidae, além de muitas moscas. Eles estavam cuidadosamente montados. Chamava a atenção que casais de machos e fêmeas estavam fixados juntos no mesmo alfinete, e havia a informação na etiqueta de que aqueles exemplares tinham sido coletados em cópula”, conta o colaborador.
Durante os processos minuciosos de limpeza e reestruturação dos exemplares, em que o biólogo contou com a ajuda de outros especialistas, Eli analisou e preservou cada uma das etiquetas – escritas à mão e devidamente assinadas. Assim, descobriu que a coleta foi realizada na década de 1930 pelo . Alemão radicado no Brasil, o especialista teve passagens pelo Instituto Butantan e pela Fundação Oswaldo Cruz, dedicando-se intensamente aos estudos de metamorfose, sistemática e distribuição geográfica dos insetos.
3. Mariposa que é literalmente “metade macho, metade fêmea”
Durante uma pesquisa de campo na cidade de Igaratá (SP), em 1995, o pesquisador aposentado do Instituto Butantan e antigo curador da coleção entomológica Roberto Henrique Pinto Moraes realizou uma coleta curiosa: . Na língua grega, gynos significa feminino, e andros, masculino; a condição diz respeito àqueles animais que apresentam características de macho e fêmea no mesmo espécime.
Como se fossem duas mariposas diferentes unidas pelo meio, o bicho apresenta padrões femininos à esquerda do corpo e masculinos à direita. “A diferença fica bem clara ao observar as duas antenas: de um lado ela é filiforme, como a das fêmeas; do outro, plumosa, típica dos machos. Além dessa, há diferenças no formato e na coloração das asas”, esclarece a técnica de laboratório da Coleção Entomológica, Natalia Khatourian.4. Espécimes-tipo: as “figurinhas brilhantes”
São conhecidos como “espécimes-tipo” os “indivíduos originais” utilizados na descrição de uma determinada espécie. Devido à sua relevância científica, eles precisam ser mantidos a sete chaves como uma forma de garantia, caso no futuro algum outro pesquisador necessite confirmar informações ou características que já foram previamente definidas. “Nós comparamos os tipos às figurinhas brilhantes dos álbuns colecionáveis. São itens raros e de alto valor científico”, observa Flávia Virginio. Na coleção entomológica do Instituto Butantan, por exemplo, há espécimes-tipo de diferentes espécies de flebotomíneos, datados do início do século passado. Conhecidos popularmente como mosquitos-palha, esses insetos hematófagos são de interesse para a medicina humana e veterinária, uma vez que podem estar relacionados à transmissão da leishmaniose.5. Uma linguaruda tupiniquim
As mariposas com probóscide avantajada ganharam fama devido às lá pelos idos de 1860. Ao observar o extenso nectário de uma orquídea-cometa (Angraecum sesquipedale), o britânico inferiu sobre a existência de uma mariposa de longuíssima espirotromba (órgão similar a uma língua), essencial para o processo de polinização e reprodução da planta. Quatro décadas após suas primeiras afirmações, o inseto linguarudo foi, enfim, descrito, confirmando mais a teoria do pai da evolução.
Apesar da “espécie de Darwin” ser nativa da Ilha de Madagascar, na África, existem mariposas com características bastante semelhantes a ela em outros lugares do mundo – uma delas é a Neococytius cluentius, nativa do Brasil. Integrante da família Sphingidae, o espécime da coleção entomológica do Butantan possui 24 centímetros só de probóscide e demanda bastante cuidado nos momentos de manipulação e conservação. “Ele é um bicho robusto, por isso se torna mais propenso a ser colonizado por fungos quando a umidade fica descompensada”, explica Natália, acostumada a trabalhar com o exemplar.
Além disso, se a coleção está com infestação de insetos-praga, como os da ordem Psocoptera, as mariposas da família Sphingidae são um prato cheio, já que possuem bastante massa corpórea. “Por isso, nossa equipe está sempre atenta a qualquer alteração, por menor que ela seja. O objetivo é manter problemas curatoriais bem longe do acervo”, complementa Flávia.