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Ed Sullivan, o homem que ativou a Beatlemania global

Há 60 anos, os Beatles se apresentaram no programa de domingo à noite do apresentador e nada mais foi o mesmo na cultura pop

Um autêntico grande marco histórico da música pop completa 60 anos neste 9 de fevereiro: a apresentação ao vivo dos Beatles no programa de TV “The Ed Sullivan Show” em Nova York, Estados Unidos. Vista por 73,7 milhões de telespectadores (60% dos televisores ligados nos EUA naquele domingo), bateu o recorde de audiência – que durou três anos – e, sem exagero, transformou uma geração de americanos. 

E seu efeito se espalhou para o resto do mundo, graças à onipresença do entretenimento americano numa enorme parte dos países do planeta. Os Beatles já eram mega em seu Reino Unido natal, mas se tornaram mundiais ao chegarem ao topo do sucesso nos Estados Unidos naquele início de 1964. 

“Beatles no Ed Sullivan” é o início do que, culturalmente, chamamos de “anos 60”. Aqueles quatro ingleses de cabelos “absurdamente” compridos (para a época), espontâneos e espertos, que tocavam seus instrumentos e compunham as próprias músicas, mostraram o caminho para inúmeros adolescentes e jovens adultos se animarem a fazer o mesmo.

Sim, havia um empresário inteligente por trás. Brian Epstein exigiu que seus pupilos fossem a atração principal do programa de Ed Sullivan, que sempre trazia atrações muito variadas e diferentes entre si: de gênios do jazz a cantores melosos, de comediantes fazendo stand-up a malabaristas.

Sullivan também usou seu faro do que era sucesso. Ao que consta, estava parado numa escala de avião no aeroporto de Heathrow em Londres, Inglaterra, em outubro de 1963 quando testemunhou a loucura das fãs dos Beatles que foram receber o quarteto, que retornava de uma turnê pela Europa continental. 

Também houve um pesado esquema de marketing da gravadora Capitol para fazer as músicas dos Beatles tocarem à exaustão nas rádios americanas durante janeiro de 1964. Isso levou a música “I Want to Hold Your Hand” ao 1º lugar da parada dos EUA uma semana antes da apresentação no Ed Sullivan.

The Beatles: “I Want To Hold Your Hand”(9/2/1964)

Isso levou a uma procura absurda por um dos 728 lugares no Studio 50 do canal CBS (uma das três redes nacionais de TV aberta nos EUA de então). Houve 50 mil pedidos de ingresso. Oito anos antes, a primeira apresentação de Elvis Presley no “The Ed Sullivan Show” (outro verdadeiro marco pop) teve 7 mil pedidos de ingresso.

Mas quem foi Ed Sullivan? E por que seu programa teve tanta importância?

Pelos padrões atuais, Ed Sullivan (1901-1974) jamais seria apresentador de um programa em horário nobre. Era desajeitado, seu sorriso sempre parecia forçado (mesmo quando não era), sua postura corporal era tensa e reprimida, seu rosto estava bem longe da classificação de galã. Mas era bem apessoado, agradava às famílias e sabia tudo de show business americano.

Sullivan começou no jornalismo impresso em Nova York aos 18 anos. Escreveu para vários jornais sobre esporte. Em 1929, foi colocado pelo diário “New York Evening Graphic” (hoje extinto) para ser colunista da Broadway, já então o principal centro de teatro dos EUA.

O jornalista firmou-se nos anos 1930 conhecendo tudo sobre a Broadway e o mundo dos espetáculos, e trazendo as melhores notícias para o público. De tão conhecido, foi fisgado em 1941 pela rádio CBS para apresentar um programa de variedades, com um artista convidado e uma orquestra da casa.

Nos primórdios da TV, a CBS estabeleceu-se como uma das três redes nacionais americanas, junto à NBC e à ABC. 

Na busca por atrações naquele início ainda quase sem fórmulas, em 1948 a nova emissora de TV deu um programa de noite de domingo (das 20h às 21h) para Ed Sullivan repetir na tela o que fazia no rádio. Com mais convidados. 

O programa foi batizado de “Toast of the Town”, nome que durou até 1955 quando tornou-se “The Ed Sullivan Show”, que era como o público já se referia à atração havia anos.

Com altos e baixos de audiência e prestígio, Ed Sullivan manteve seu programa no ar até 1971, quando os números do “ibope” determinaram seu cancelamento pela CBS. O apresentador morreu de câncer no esôfago em outubro de 1974.

Apesar de conservador na aparência, Sullivan foi relativamente ousado. Nos anos 1950, abriu seu palco para inúmeros artistas negros numa época em que a segregação racial nos EUA ainda era feroz. 

Também deu lugar aos rebeldes do rock’n’roll dos anos 1950 (mas ordenou que as câmeras não localizassem os quadris inquietos de Elvis Presley) e aos contestadores dos anos 1960 (mas impediu que Bob Dylan cantasse uma música de alto teor político).

Muitos trechos extraídos de programas de Sullivan estão disponíveis na internet através do site oficial “Ed Sullivan Show () e do canal oficial no YouTube ().

Abaixo, alguns momentos de “The Ed Sullivan Show” que vão do sublime ao bizarro.

Pensacola Naval Air Cadets: “Anchors Aweigh” (3/7/1955)

Não era incomum que uma banda militar aparecesse no programa de Ed Sullivan. Este é só um exemplo.

Andrés Segovia: “Prelude For Lute In C Minor, BWV 999 – Arr. For Guitar”

E, entre comediantes e artistas circenses, Sullivan era capaz de abrir espaço para um dos maiores violonistas clássicos de todos os tempos, o espanhol Andrés Segovia.

Elvis Presley: “Hound Dog” (28/10/1956)

Elvis no show de Sullivan teve um efeito parecido com o que os Beatles teriam em 1964. Mas ele não era uma figura misteriosa para o público. Já tinha aparecido em outros programas de TV antes.

Ed Sullivan & Brigitte Bardot: “Ed Conducts Interview With Brigitte Bardot” (1/10/1961)

Sullivan não dependia apenas de atrações musicais. Neste vídeo, ele entrevista a atriz francesa Brigitte Bardot, maior símbolo sexual do cinema mundial naquela época.

Chubby Checker: “The Twist & Let’s Twist Again” (22/10/1961)

Antes dos Beatles, a maior mania pop foi o ritmo twist. Seu rei era Chubby Checker, aqui emendando seus dois maiores sucessos.

Louis Armstrong & Duke Ellington “In A Mellow Tone” (17/12/1961)

Dois gigantes do jazz, que já eram lendas durante suas vidas, dividindo o palco de Sullivan. Sim, isso aconteceu.

Ed Sullivan & Topo Gigio: “Ed Puts Topo To Bed” (14/4/1963)

Topo Gigio era uma marionete de ratinho criada na Itália. Sullivan importou a atração, devidamente dublada para o inglês, e até contracenou com o boneco para agradar o público infantil que assistia ao programa junto com os pais. Seis anos depois disso, foi a vez de o Brasil ter sua Topo Gigio-mania, com programa na TV Globo e participação do humorista Agildo Ribeiro como parceiro do camundongo.

The Supremes: “Come See About Me” (27/12/1964)

O trio liderado por Diana Ross passou pelo palco de Sullivan várias vezes durante os anos 1960, quando reinou como grupo vocal pop.

The Rolling Stones: “(I Can’t Get No) Satisfaction” (13/2/1966)

Os Stones aprontaram algumas com Sullivan, que se irritou com o comportamento deles ou das fãs algumas vezes. Mas a banda sempre retornava ao programa.

The Jackson 5: “I Want You Back” (14/12/1969)

Se formos levar em conta o impacto artístico de uma primeira vez no “The Ed Sullivan Show”, a apresentação de Michael Jackson aos 11 anos, junto aos irmãos no grupo Jackson 5, merecia ser tão lembrada quanto as de Elvis e Beatles.

The Muppets: “Mahna Mahna” (30/11/1969)

Os bonecos Muppets de Jim Henson só viriam a ter sua própria série de TV em 1976, mas viviam dando as caras em programas já nos anos 1960. Nesta apresentação no “The Ed Sullivan”, o maior clássico musical dos Muppets.

Ike & Tina Turner “Funky Street, Proud Mary & Bold Soul Sister” (11/1/1970)

Tina Turner, ainda presa ao marido espancador, botando fogo na tela, como de costume.

Roy Rogers & Dale Evans: “This Is My Country, The Fightin’ Side Of Me & What Can I Do For My Country” (5/4/1970)

Não havia mais Beatles na reta final e decadente do programa de Ed Sullivan. Sobrava espaço para dois atores-cantores dos velhos seriados de faroeste do cinema cantarem um medley patriótico.

Marcelo Orozco

Marcelo Orozco

Jornalista que adora música, cultura pop, livros e futebol. Passou por Notícias Populares, TV Globo, Conrad Editora, UOL e revista VIP. Colaborou com outros veículos impressos e da web. Publicou o livro "Kurt Cobain: Fragmentos de uma Autobiografia" (Conrad, 2002).

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