Para investigar os mecanismos de atuação dessas condições, o grupo de pesquisadores examinou padrões de expressão de proteínas em cérebros de pessoas falecidas que tinham esquizofrenia ou que morreram devido à Covid-19, a partir de estudos prévios e de bancos de dados científicos. Eles identificaram uma espécie de para cada uma das doenças. O segundo passo foi comparar esses padrões e entender quais funções do cérebro são afetadas pelas mudanças na quantidade e no tipo de proteínas presentes em relação a cérebros saudáveis.
“Nós esperávamos encontrar mais diferenças do que semelhanças, já que uma das condições é uma infecção viral aguda e a outra é uma doença que acontece desde o neurodesenvolvimento, com base genética”, explica Daniel Martins-de-Souza, pesquisador da Unicamp e autor do estudo. Contrariando as expectativas da equipe, os resultados mostram que diversas vias cerebrais em comum são afetadas pela Covid-19 e pela , especialmente em termos de impactos moleculares e funcionais do cérebro.
Para o pesquisador, o que mais chama a atenção é a semelhança entre as duas condições nos processos que aceleram o envelhecimento cerebral. Além disso, ambas modificam os processos de obtenção de energia das células cerebrais e de comunicação com o organismo. A longo prazo, essa combinação pode contribuir para deficiências cognitivas e sintomas psiquiátricos, traços já observados em casos dessas doenças. “A infecção do vírus mostra um potencial de dessintonizar a maquinaria cerebral, deixando a pessoa mais propensa a eventos psiquiátricos e, aparentemente, também aos neurodegenerativos”, comenta o autor.
Outro efeito comum entre a Covid-19 e a esquizofrenia, destacado pelo estudo, é o aumento do risco de comorbidades metabólicas, como diabetes e síndrome metabólica, um grupo de condições que eleva o risco de ataques cardíacos e derrames. Isso porque essas condições alteram a maneira como o corpo processa carboidratos, como a glicose, resultando em dificuldades para regular os níveis de açúcar no sangue. Isso, por sua vez, aumenta a probabilidade de complicações graves e a taxa de mortalidade dos pacientes afetados.
As semelhanças encontradas pelo estudo na forma como as duas doenças atingem os mecanismos cerebrais podem levar a mais estudos e, no futuro, ao desenvolvimento de novas terapias para tratar pacientes afetados por uma ou ambas as condições. “Talvez a gente possa aprender mais sobre esquizofrenia com os dados de Covid e vice-versa”, ressalta Martins-de-Souza. “Acho que isso encurta caminhos para eventuais tratamentos, até mesmo na perspectiva de olhar para outras infecções virais que têm o potencial de afetar o cérebro, como o zika vírus, por exemplo”, conclui.