Cerca de 400 mil pessoas morreram em 2022 no Brasil por problemas cardiovasculares
Texto: Felipe Floresti/Revista Pesquisa Fapesp
As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte no Brasil. Após uma breve perda da dianteira em 2021 para a Covid-19, que naquele ano causou 411 mil óbitos, as enfermidades do coração e do sistema circulatório retomaram a liderança. De acordo com os dados do relatório “Carga global de doenças e fatores de risco cardiovasculares” mais recente, publicado em dezembro de 2023 no Journal of the American College of Cardiology, um conjunto de 18 doenças cardiovasculares tirou a vida de aproximadamente 400 mil brasileiros em 2022, quase o equivalente ao total de mortos no pior ano da pandemia do novo coronavírus.
O relatório é parte de um estudo mais amplo chamado Carga global de doenças, ou Global burden of diseases (GBD), que envolve a participação de mais de 10 mil pesquisadores, brasileiros inclusive, e registra desde 1990 a evolução de 371 causas de morte e 88 fatores de risco relacionados a elas no mundo. Na edição de 2023 do documento sobre doenças cardiovasculares, os dados do Brasil são apresentados somados aos do Paraguai, que à época tinha 6,1 milhões de habitantes, o correspondente a cerca de 3% da população brasileira.
Nos dois países, os únicos integrantes da sub-região denominada América Latina Tropical no GBD, as doenças cardiovasculares mataram 408 mil pessoas em 2022, um aumento de 48,4% em relação às 275 mil mortes de 1990 – no período, a população dos dois países cresceu 35,6%. No mundo todo, as mortes por doenças cardiovasculares aumentaram um pouco menos, 39,4%, passando de 12,4 milhões em 1990 para 19,8 milhões em 2022, período em que a população mundial cresceu 51%. No site do GBD é possível ver os números isolados de cada país até 2019.
Dois problemas responderam, sozinhos, pela grande maioria (76%) dos óbitos em 2022 na América Latina Tropical: o infarto do miocárdio e as diferentes formas de acidente vascular cerebral (AVC). Foram 170,5 mil óbitos pelo problema cardíaco e 138,4 mil por AVC. “Os números absolutos de morte crescem porque a população está aumentando e as pessoas estão vivendo mais”, explica o médico e epidemiologista Paulo Lotufo, da Universidade de São Paulo (USP), um dos colaboradores do GBD.
“Até os anos 2000, infarto e AVC competiam como principal causa de morte nos estados brasileiros. O diagnóstico e o controle da hipertensão arterial fizeram a taxa de mortalidade por AVC cair mais do que a taxa de mortes por infarto”, conta a cardiologista Luisa Brant, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), também colaboradora do GBD. A proporção de mortes por AVC em cada grupo de 100 mil passou de 138 em 1990 para 58 em 2019, queda de 58%. A de infarto baixou 52,5%, de 158 para 75, no mesmo período.
Embora a hipertensão seja o principal fator de risco para os dois problemas, distúrbios metabólicos como o diabetes não controlado e os níveis de colesterol elevados, frequentes na população brasileira, favorecem a ocorrência do infarto, ainda hoje a principal causa de morte em todos os estados brasileiros, explica a pesquisadora.“Um indivíduo que passa um ano com pressão alta vai ter um determinado risco de sofrer um infarto. Se ele não se cuidar de forma adequada, após 20 anos, o risco torna-se muito maior, uma vez que se soma ao envelhecimento natural das artérias e a diferentes fatores de risco e exposição, que se associam negativamente e geram danos”, explica o cardiologista e pesquisador André Durães, da Universidade Federal da Bahia (UFBA), outro participante do GBD. “Para que as estratégias de saúde pública surtam efeito e reduzam as mortes por problemas cardiovasculares, é preciso combater cada um dos principais fatores de risco. Para tanto, são necessárias a ampliação do acesso à atenção primária à saúde, que ainda não é universal, e a conscientização das pessoas para que tenham um estilo de vida saudável, incluindo dieta equilibrada e prática de atividade física”, afirma.
Artigos científicos
MENSAH, G. A. et al. . Journal of the American College of Cardiology. dez. 2023.
MENSAH, G. A. et al. . Journal of the American College of Cardiology. dez. 2023.