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60 anos do assassinato de John Kennedy, o primeiro presidente pop

De tema de campanha cantado por Sinatra até uma música longuíssima de Bob Dylan, o presidente dos Estados Unidos foi celebrado em vida e pós-morte
Imagem: Reprodução
A pergunta “onde você estava quando (tal coisa aconteceu)?…” já se aplicou às mortes de John Lennon, Ayrton Senna ou aos atentados de 11 de setembro de 2001 em Nova York. Mas o primeiro fato chocante a provocar essa questão foi o assassinato de John F. Kennedy, presidente dos Estados Unidos, há exatos 60 anos.

O mundo travou com o impacto da notícia porque JFK foi uma espécie de “primeiro político pop”.

Jovem (tinha 43 anos ao se eleger e tomar posse, e 46 anos ao morrer), sorridente, bonitão, galanteador, ícone das ilusões de um futuro melhor para toda uma geração de americanos, Kennedy iniciava sua campanha para se reeleger em 1964. Na sexta-feira, 22 de novembro de 1963, JFK desfilava em carro aberto pelas ruas de Dallas, Texas, quando teve sua cabeça estourada por tiros de rifle. Vale dizer que o famoso filme do cinegrafista amador Abraham Zapruder, que flagrou os tiros atingindo o presidente, só veio a público algum tempo depois, não no mesmo dia. Oficialmente, o autor do assassinato foi um suposto comunista chamado Lee Harvey Oswald, preso horas depois do crime. A autoria é questionada por dezenas de teorias da conspiração há 60 anos.

Oswald nem chegou a contar o que poderia saber sobre outros envolvidos eventuais. Foi igualmente assassinado dois dias depois na porta de um distrito policial quando seria transferido para outra cadeia. Detalhe: sua morte foi transmitida ao vivo em cadeia nacional de TV para todos os Estados Unidos. O assassino de Oswald foi um, digamos, empresário do show business noturno para o público masculino chamado Jack Ruby. Ele tinha um monte de enroscos com a Máfia. Preso em flagrante, Ruby morreu de câncer na cadeia aos 55 anos, em janeiro de 1967. Se a motivação de Ruby para assassinar o assassino de Kennedy tinha algo secreto, ele ficou sem revelar. Justificou-se apenas dizendo que não queria que a primeira-dama viúva Jacqueline Kennedy sofresse cada vez que visse Oswald na TV. Perfeitamente crível.

Fatos reais e teorias da conspiração sobre a morte de Kennedy (e a vida também) tomariam um site inteiro com muita canseira para o servidor. A influência disso no imaginário popular e em filmes (“JFK: A Pergunta Que Não Quer Calar”, de Oliver Stone), séries (“Mad Men”, um episódio de “Seinfeld”) e livros (obras de James Ellroy e Stephen King) também é enorme. Por isso, fiquemos apenas com momentos da música pop que tiveram John Kennedy como inspiração.

1- Frank Sinatra – “High Hopes” (1960)

Que tal ter seu tema de campanha para presidente na voz do maior e mais famoso cantor de sua época? E que grava a música menos pelo dinheiro que por realmente acreditar na candidatura? O mito pop de John Kennedy teve isso. O jingle oficial “High Hopes” foi lançado por Frank Sinatra em 1960. Sinatra e Kennedy se tornaram amigos do peito nesse período. Foi graças ao cantor que o candidato e depois presidente levou a estrela Marilyn Monroe para a cama, além de outras atrizes desconhecidas. Sinatra até organizou todo o show da posse de JFK em janeiro de 1961. A amizade eterna durou até março de 1962. Kennedy iria fazer uma visita à Califórnia e Sinatra mandou construir uma suíte presidencial com heliponto em sua mansão em Palm Springs para hospedá-lo. Só que Robert Kennedy, irmão de JFK que ocupava o posto equivalente ao de ministro da Justiça no Brasil, aconselhou o presidente a se afastar de Sinatra por causa das ligações e amizades do cantor com mafiosos. JFK acabou se hospedando na casa do cantor-ator Bing Crosby, notório eleitor do Partido Replublicano, rival do Partido Democrata do presidente. Possesso de raiva, Sinatra destruiu o heliponto com uma marreta, nunca mais quis saber dos Kennedy e virou um conservador republicano pelo resto da vida, abandonando sua longa história de eleitor dos democratas.

2- Marilyn Monroe – “Happy Birthday Mr. President” (1962)

A festa de 45º aniversário do presidente Kennedy, em 19 de maio de 1962, foi um grande evento de gala no Madison Square Garden, em Nova York. Mas só uma atração é lembrada até hoje: a performance de Marilyn Monroe, maior estrela do cinema na época e amante de Kennedy, num vestido justíssimo cantando uma versão adaptada de “Parabéns a Você”. Depois de Marilyn, Kennedy vai ao palco nitidamente constrangido pelo presente que acabou de receber da atriz. Menos de três meses depois, Marilyn morreu por uma suposta overdose de tranquilizantes aos 36 anos. O vídeo acima de “Happy Birthday Mr. President” com Marilyn Monroe é colorizada. A transmissão original foi em preto e branco.

3- The Byrds – “He Was a Friend of Mine” (ao vivo no Festival de Monterey, 1967)

O quinteto americano de folk-rock The Byrds alcançou um sucesso gigantesco em 1965 logo em seu primeiro lançamento, uma cover encurtada de “Mr. Tambourine Man”, de Bob Dylan. Para seu segundo álbum “Turn! Turn! Turn!”, lançado em dezembro de 1965, seu líder e guitarrista Jim McGuinn (pouco depois, ele mudaria seu prenome para Roger) preparou um tributo a John Kennedy. Segundo McGuinn, ele adaptou na noite do assassinato uma canção tradicional do folclore americano, sem autor conhecido, que teve sua primeira gravação em 1939. O byrd compôs versos novos que faziam referência direta a Kennedy, como “ele estava em Dallas”, “de uma janela do sexto andar um atirador o acertou” e “líder de uma nação por um tempo precioso”. Em 1967, os Byrds se apresentaram no Monterey Pop Festival. Antes de “He Was a Friend of Mine”, o guitarrista politicamente engajado David Crosby fez um curto discurso questionando a versão oficial de que Lee Harvey Oswald foi o único assassino do presidente. Os Byrds ficaram de fora do documentário original “Monterey Pop”, lançado meses depois do festival. Essa apresentação de “He Was a Friend of Mine” só veio a público oficialmente em 2002, quando uma caixa com apresentações de Monterey foi lançada.

4- Dion – “Abraham, Martin & John” (1968)

Acompanhado de seu grupo The Belmonts, Dion conseguiu bastante sucesso no começo da década de 1960 com seu estilo doo-wop de ítalo-americano durão. Em 1968, Dion já estava em sua encarnação de cantor-compositor maduro. Dion acertou na mosca com um tributo a três grandes personagens da história americana mortos a bala: os presidentes Abraham Lincoln (em 1865) e John Kennedy, e o líder negro Martin Luther King (em abril de 1968). O vídeo acima é da apresentação de Dion no programa “The Smothers Brothers Show”. A música “Abraham, Martin and John” também fez sucesso em 1969 na voz peculiar da comediante negra Moms Mabley.

5- The Rolling Stones – “Sympathy for the Devil” (1968)

Em 1968, depois de férias no Brasil, Mick Jagger e Keith Richards compuseram este rock-samba. Na letra, Jagger decidiu colocar Satanás como narrador, orgulhando-se de sua influência em guerras e tragédias ao longo da história. O verso “Eu gritei ‘quem matou Kennedy?’ ” estava pronto quando Robert Kennedy, irmão mais novo de John, também foi assassinado em junho de 1968 quando fazia campanha para ser indicado como candidato a presidente pelo Partido Democrata. Jagger optou pela saída mais fácil possível e modificou o verso para “Eu gritei ‘quem matou OS Kennedys?’ “. O vídeo é do especial de TV “Rock and Roll Circus”, gravado em 1968 e engavetado até seu lançamento em videocassete em 1996.

6- The Misfits – “Bullet” (1978)

Muito antes de ser mais conhecida pelas camisetas fashion usadas por aí até por quem não faz ideia de que é The Misfits, a banda fez um punk-rock sinistro e potente entre 1977 e 1983. Seu segundo compacto, lançado em 1978, foi “Bullet”, com letra que remete ao assassinato de Kennedy – e que não faz muita cerimônia para emplacar referências sexualmente sugestivas para Jacqueline Kennedy, que estava ao lado do presidente no carro aberto. O vídeo acima é uma animação baseada em imagens do dia fatídico em Dallas.

7- Lou Reed – “The Day John Kennedy Died” (ao vivo, 2003)

Lou Reed compôs uma crônica sobre John Kennedy e pessoas comuns no dia do assassinato. A versão original saiu em 1982, no álbum “The Blue Mask”. A versão acima foi gravada ao vivo em Los Angeles em 2003 e lançada no álbum “Animal Serenade”, de 2004. Na letra, Reed cita um jogo de futebol americano sendo exibido na TV. Houve quem contestasse que não ocorreu qualquer partida naquele dia. Mas o poeta se justificou dizendo que era assim que sua memória guardava o 22 de novembro de 1963.

8- XTC – “The Ballad of Peter Pumpkinhead” (1992)

O grupo inglês de pop-rock alternativo XTC montou o videoclipe de sua música “The Ballad of Peter Pumpkinhead” com referências a John Kennedy e seu fim trágico. Até mesmo uma sósia de Marilyn Monroe marca presença. A canção é do álbum “Nonsuch”, de 1992.

9- Lana Del Rey – “National Anthem” (2012)

Para “National Anthem”, música de seu segundo álbum “Born to Die”, a cantora americana Lana Del Rey também se inspirou em JFK para o videoclipe. E ela interpreta tanto Marilyn Monroe (com cabelo escuro!) cantando “Happy Birthday Mr. President” quanto a primeira-dama Jacqueline Kennedy.

10- Bob Dylan – “Murder Must Foul” (2020)

Em plena pandemia de Covid-19, Bob Dylan – já com um Prêmio Nobel de Literatura em sua estante – saiu da toca depois de três anos e lançou a solene e longa (praticamente 17 minutos) ode a John Kennedy que também buscava refletir sobre os efeitos e reflexos do assassinato sobre a história e a sociedade dos Estados Unidos em todos os anos que se seguiram. Pouco depois de seu lançamento isolado, “Murder Must Foul” (expressão tirada da peça “Hamlet”, de William Shakespeare) foi incluída no álbum “Rough and Rowdy Ways”.

PS: bandas nada lisonjeiras

JFK e seu assassinato inspiraram os nomes de pelo menos duas bandas de rock alternativo – ambas optando por ir contra a maré de tributo respeitoso ao presidente. A mais famosa é Dead Kennedys, glória californiana do punk americano liderada pelo vocalista Jello Biafra. “Kennedys mortos” pode se referir tanto aos assassinados John e Robert, como a vários outros membros da família vitimados por uma suposta “maldição dos Kennedy” – como o pai deles, Joseph Kennedy (ex-traficante de bebidas na Lei Seca e ex-embaixador americano no Reino Unido), e o irmão mais velho de JFK, Joseph Jr.,que morreu na Segunda Guerra Mundial antes que pudesse se tornar o político que o patriarca planejava. Outra é bem menos conhecida e homenageia o assassino de JFK: The Lee Harvey Oswald Band. É uma banda alternativa de Chicago que lançou apenas dois álbuns e um EP entre 1989 e 1996. Fez um EP temporão em 2016.
Marcelo Orozco

Marcelo Orozco

Jornalista que adora música, cultura pop, livros e futebol. Passou por Notícias Populares, TV Globo, Conrad Editora, UOL e revista VIP. Colaborou com outros veículos impressos e da web. Publicou o livro "Kurt Cobain: Fragmentos de uma Autobiografia" (Conrad, 2002).

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